Outro dia, numa roda de
amigos, surgiu a discussão sobre qual era o melhor esquema para se usar em
determinada equipe do futebol brasileiro. As pessoas ali presentes atrelavam à
palavra “esquema”, uma série de conjuntos numéricos, do tipo 433, 442, 354,
4141.
Perguntado sobre o que eu
preferia, eu simplesmente respondi que não compreendia os esquemas táticos de futebol
traduzidos em “linhas de ônibus”. Fez-se um silêncio, uma espécie de
curiosidade para o desfecho da minha fala, que vou traduzir mais ou menos como
foi, no parágrafo abaixo.
A complexidade que o futebol
nos oferece e os constantes deslocamentos de jogadores em função de
circunstâncias diversas (marcar, correr até a bola, realizar uma cobertura,
cobrar uma falta, se desmarcar), impossibilitam simplificar um esquema de jogo
apenas a um conjunto de números. O zagueiro vira atacante na hora que seu time
vai cobrar escanteio; o atacante vira zagueiro na hora de marcar uma bola
alçada na área pelo time adversário; o ponta vira lateral quando acompanha o
lateral adversário até a linha de fundo defensiva; o lateral vira meia quando
entra em diagonal para enfiar uma bola ao centroavante. Esporte de invasão,
como o futebol, funciona assim...os jogadores circulam o campo todo, mudam de posição
em questões de segundos.
Podemos ilustrar tal fato
pegando vários exemplos. Um deles é Lucas Paquetá, jovem promissor da base do
Flamengo, que hoje atua na equipe principal, de titular. Paquetá circula pelo
campo todo...hora está na direita, hora está na esquerda, hora joga pelo
meio...tem vezes que parece até um lateral, marcando o atacante adversário na
bandeirinha defensiva. Paquetá não tem uma posição definida. Ele não é
atacante, não é meia, não é ponta...ele “está ponta”, ele “está lateral”, ele “está
atacante”.
E parece ser uma dificuldade
mundial, em especial no Brasil, entender esse dinamismo que o futebol nos
oferece. Aqui, tudo parece ainda funcionar de maneira mais pragmática possível.
É preciso ter dois laterais, dois zagueiros, três ou quatro meio-campistas e
dois ou três atacantes. Qualquer coisa diferente disso é invenção. Colocar um
atacante na lateral, por exemplo, é quase uma heresia, ao ponto de usarmos a
palavra “improvisar”, como se estivéssemos usando um balde par cozinhar arroz,
já que não tem panela.
Os treinos em campo reduzido
muitas vezes seguem a lógica de não existir uma posição pré determinada para
cada jogador. Todos desempenham o mesmo tipo de trabalho, São os tais “jogos
condicionados”, como por exemplo, o “bobinho”. Há algum tempo, o “bobinho” era
usado como forma de aquecimento, como se fosse uma brincadeira. Hoje, muitos
treinos de alto rendimento são baseados no “bobinho”. Alías, vamos relembrar um
pouco do Barcelona do Guardiola (melhor time de futebol dos últimos tempos). O
que Iniesta, Xavi, Villa, Messi e companhia faziam com os adversários, não era
uma espécie de bobinho? Com a bola em posse, era quase impossível o adversário
roubá-la...quando o adversário enfim conseguia a posse de bola, era quase impossível
mantê-la por mais de 15 segundos.
Falando de Barcelona, de
esquema tático e de número, qual seria a composição numérica mais adequada para
descrever aquela equipe? 442, 433, 352? Eu,
sinceramente, acredito que a melhor definição é 11! Eram 11 jogadores dentro de
campo, espalhados, espaçados, sem perder a organização. Um time dos mais
organizados, sem precisar ter uma “linha de quatro”, sem precisar jogar “com um
homem fixo na frente”, sem precisar de “dois homens na contenção”.
Dentro dessa lógica numérica
adotada por muitas pessoas, criou-se até a expressão “falso 9”, que
sinceramente, estou tentando entender até hoje. Fazendo essa pergunta por aí,
já obtive muitas respostas diferentes, mas a maioria gira em torno de “o
centroavante que joga na grande área, mas tem horas que sai da grande área”. Sinceramente,
se isso é ser um “falso 9”,eu estou até agora procurando um “verdadeiro 9”, porque
eu nunca vi um jogo de futebol onde o centroavante passe os 90 minutos dentro
da grande área. Nessa lógica, daqui a pouco vai ter gente chamando Manuel Neuer
de “falso 1”, pois trata-se de um goleiro que as vezes joga na intermediária.
Em tempo de Copa do Mundo,
vale refletir. Diante do fiasco apresentado pelo Brasil nos últimos Mundiais,
vale pensar um pouco a respeito do futebol, vale discutir o futebol como
ciência, vale a pena falar sobre métodos de treinamentos. Vale a pena, esquecer
um pouco os números. Pois o brasileiro, parece que por natureza, tem a mania de
falar de número. “O que importa é que ganhamos por 1x0” “Ele joga como camisa 9
ou como camisa 10” “Vai entrar no 433 ou no 442” “Ele ganhou só um Estadual e
uma Copa do Brasil” “Ele fez 234 gols na carreira, o outro fez 390”
De tanto falar de número, a
gente esquece de falar do mais legal de tudo, que é o futebol!
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