terça-feira, junho 05, 2018

UM POUCO MENOS SOBRE NÚMERO, UM POUCO MAIS SOBRE FUTEBOL.

Por Danilo Silveira


Outro dia, numa roda de amigos, surgiu a discussão sobre qual era o melhor esquema para se usar em determinada equipe do futebol brasileiro. As pessoas ali presentes atrelavam à palavra “esquema”, uma série de conjuntos numéricos, do tipo 433, 442, 354, 4141.
Perguntado sobre o que eu preferia, eu simplesmente respondi que não compreendia os esquemas táticos de futebol traduzidos em “linhas de ônibus”. Fez-se um silêncio, uma espécie de curiosidade para o desfecho da minha fala, que vou traduzir mais ou menos como foi, no parágrafo abaixo.

A complexidade que o futebol nos oferece e os constantes deslocamentos de jogadores em função de circunstâncias diversas (marcar, correr até a bola, realizar uma cobertura, cobrar uma falta, se desmarcar), impossibilitam simplificar um esquema de jogo apenas a um conjunto de números. O zagueiro vira atacante na hora que seu time vai cobrar escanteio; o atacante vira zagueiro na hora de marcar uma bola alçada na área pelo time adversário; o ponta vira lateral quando acompanha o lateral adversário até a linha de fundo defensiva; o lateral vira meia quando entra em diagonal para enfiar uma bola ao centroavante. Esporte de invasão, como o futebol, funciona assim...os jogadores circulam o campo todo, mudam de posição em questões de segundos.

Podemos ilustrar tal fato pegando vários exemplos. Um deles é Lucas Paquetá, jovem promissor da base do Flamengo, que hoje atua na equipe principal, de titular. Paquetá circula pelo campo todo...hora está na direita, hora está na esquerda, hora joga pelo meio...tem vezes que parece até um lateral, marcando o atacante adversário na bandeirinha defensiva. Paquetá não tem uma posição definida. Ele não é atacante, não é meia, não é ponta...ele “está ponta”, ele “está lateral”, ele “está atacante”.

E parece ser uma dificuldade mundial, em especial no Brasil, entender esse dinamismo que o futebol nos oferece. Aqui, tudo parece ainda funcionar de maneira mais pragmática possível. É preciso ter dois laterais, dois zagueiros, três ou quatro meio-campistas e dois ou três atacantes. Qualquer coisa diferente disso é invenção. Colocar um atacante na lateral, por exemplo, é quase uma heresia, ao ponto de usarmos a palavra “improvisar”, como se estivéssemos usando um balde par cozinhar arroz, já que não tem panela.

Os treinos em campo reduzido muitas vezes seguem a lógica de não existir uma posição pré determinada para cada jogador. Todos desempenham o mesmo tipo de trabalho, São os tais “jogos condicionados”, como por exemplo, o “bobinho”. Há algum tempo, o “bobinho” era usado como forma de aquecimento, como se fosse uma brincadeira. Hoje, muitos treinos de alto rendimento são baseados no “bobinho”. Alías, vamos relembrar um pouco do Barcelona do Guardiola (melhor time de futebol dos últimos tempos). O que Iniesta, Xavi, Villa, Messi e companhia faziam com os adversários, não era uma espécie de bobinho? Com a bola em posse, era quase impossível o adversário roubá-la...quando o adversário enfim conseguia a posse de bola, era quase impossível mantê-la por mais de 15 segundos.

Falando de Barcelona, de esquema tático e de número, qual seria a composição numérica mais adequada para descrever aquela equipe? 442, 433, 352?  Eu, sinceramente, acredito que a melhor definição é 11! Eram 11 jogadores dentro de campo, espalhados, espaçados, sem perder a organização. Um time dos mais organizados, sem precisar ter uma “linha de quatro”, sem precisar jogar “com um homem fixo na frente”, sem precisar de “dois homens na contenção”.

Dentro dessa lógica numérica adotada por muitas pessoas, criou-se até a expressão “falso 9”, que sinceramente, estou tentando entender até hoje. Fazendo essa pergunta por aí, já obtive muitas respostas diferentes, mas a maioria gira em torno de “o centroavante que joga na grande área, mas tem horas que sai da grande área”. Sinceramente, se isso é ser um “falso 9”,eu estou até agora procurando um “verdadeiro 9”, porque eu nunca vi um jogo de futebol onde o centroavante passe os 90 minutos dentro da grande área. Nessa lógica, daqui a pouco vai ter gente chamando Manuel Neuer de “falso 1”, pois trata-se de um goleiro que as vezes joga na intermediária.

Em tempo de Copa do Mundo, vale refletir. Diante do fiasco apresentado pelo Brasil nos últimos Mundiais, vale pensar um pouco a respeito do futebol, vale discutir o futebol como ciência, vale a pena falar sobre métodos de treinamentos. Vale a pena, esquecer um pouco os números. Pois o brasileiro, parece que por natureza, tem a mania de falar de número. “O que importa é que ganhamos por 1x0” “Ele joga como camisa 9 ou como camisa 10” “Vai entrar no 433 ou no 442” “Ele ganhou só um Estadual e uma Copa do Brasil” “Ele fez 234 gols na carreira, o outro fez 390”

De tanto falar de número, a gente esquece de falar do mais legal de tudo, que é o futebol!  

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